quinta-feira, 2 de julho de 2015

Embaixo do pé de Jasmim

– Vô?
– Sim meu filho.
– Eu não sou teu filho.
– O que é então?
– Teu neto!
– Ah. Está bem meu neto. Ias me perguntar algo?
– Sim. Quem é aquela menina?
– Hum. É a filha do capataz.
– O que é capataz?
– É o homem que cuida da fazenda para mim, meu braço direito.
– Braço direito?
– Sim – risos – quer dizer meu ajudante número um.
– E o que ela está fazendo?
– Acho que está lendo.
– Embaixo daquela árvore?
– Ela sempre lê ali. Ela gosta.
– Por quê?
– É um pé de Jasmim, dá uma flor muito cheirosa nesta época.
– Posso falar com ela?
– Claro! Ela é uma menina muito doce.
Alguns passos depois ...
– Oi.
– Olá. Qual o teu nome?
– Paulinho e o teu?
– Dora.
– O que está lendo?
– Um livro de poesia, gostas?
– Não! Isto é coisa de meninas.
– Quem disse?
– Meu pai.
– Ele está errado, sabia?
– Será?
– Deixa para lá. Quantos anos tu tens?
– Nove.
– Eu também.
– Por que tu estás embaixo desta árvore?
– Porque gosto do perfume das flores.
– É! tens razão é muito perfumada.
– Tu és da cidade, né?
– Sim. Como sabes?
– Nunca te vi aqui e depois parece que sabes pouco do campo.
– É a primeira vez que passo as férias aqui na fazenda do vovô.
– Estás gostando?
– Cheguei hoje, mas até agora gostei e tu gostas daqui?
– Sim! É silencioso de dia e de noite. Tem os animais, as flores e o campo.
– Vais ficar aqui a vida toda?
– Não. Eu quero estudar e ser Doutora de animais.
– O vovô está me chamando. Amanhã tu virás aqui?
– Sim. Eu venho todos os dias.
Os dias passam. Paulinho e Dora se tornam muito amigos, mas chega o fim das férias.
– Dora! Gostei muito de te conhecer.
– Eu também. Quando tu voltas?
– Nas próximas férias, acho.
– Vai demorar, né?
– Acho que sim.
– Que pena.
– Pena mesmo. Esta noite eu sonhei contigo.
– Que sonho? Paulinho.
– Que estávamos sentados embaixo do pé de Jasmim, com este campo verde cercado de rosas, comendo chocolate.
– Gostei, vou pedir para o papai plantar as rosas ao redor do campo.
– Legal! Quando eu voltar, trago o chocolate da cidade.
As crianças começam a rir, deixam cair uma lágrima e se abraçam carinhosamente. Enquanto Paulinho se afasta, caminhando de costas, Dora vai acompanhando com os olhos. Então, começa a cair uma chuva fina e quente. Paulinho abre os braços e levanta a cabeça para o céu sentindo, no rosto, os pingos caírem.
– Ei – exclama ela – o que estás fazendo? Sai desta chuva.
– Adoro sentir os pingos – gritou ele.
Nas férias do ano seguinte, Paulinho não vai a fazenda devido a uma viagem realizada por sua família. Ambos ficaram com o coração apertado.
Mais um ano se finda. Porém, o avô de Paulinho falece e a família vende a fazenda. O pai de Dora arruma outro emprego em uma fazenda muito mais longe.
O tempo passa, Paulinho se forma em Agronomia. Ele tem alguns relacionamentos que nunca conseguem evoluir. Parece preso ao amor que sentiu quando criança. Entretanto, mal no amor bem nos negócios. Ele faz muito sucesso no seu ramo e é indicado para fazer um trabalho em uma fazenda localizada em outro estado. Chegando ao local, foi recebido pelo dono, mas repara o campo verde cercado por rosas e uma moça sentada embaixo de um pé de Jasmim e pergunta:
– Quem é a moça?
O dono da fazenda sorri e responde: – Nossa Veterinária Dra. Lice.
– Ah (decepção) – Por um momento achei que a conhecia.
– É mesmo? Confundiu com alguém?
– Acho que sim. Este cenário é muito familiar.
– Vamos lá, eu te apresento a ela.
E chegando próximo...
– Doutora! Este é o nosso novo Engenheiro Agrônomo, Dr. Paulo. Deixarei vocês conversando.
– Tu me lembras alguém – disse ela.
– Engraçado. Por um momento achei te conhecia.
– Por quê?
– Reparei o campo, as rosas, tu sentadas embaixo deste pé de Jasmim.
Lembrei de um sonho que tive há muito tempo e de uma pessoa muito especial.
– Mesmo – exclamou a Doutora – e se começasse a chover agora o que tu farias?
– Eu abriria os braços, olharia para o céu e deixaria a chuva cair no meu rosto para sentir os pingos.
– Paulinho?
– Dora? Mas como? Dra. Lice?
– É de Doralice – risos – eu odiava este nome. Lice é da faculdade.
Os dois se abraçam e um longo beijo de amor é assistido pelos pássaros.
– Pensei que nunca mais iria te encontrar – disse ele.
– Pois é, quando teu avô faleceu nos mudamos para cá. Eu me formei em veterinária e acabei trabalhando nesta fazenda onde meu pai se aposentou. Pedi a ele para plantar as rosas e eu mesmo plantei o pé de Jasmim.
– Parece meu sonho.
– Eu lembro, mas está faltando o chocolate.
Deram risadas e saíram caminhando pelo campo em direção ao pôr do Sol revezando as mãos dadas pelos abraços. Lembraram do tempo que se conheceram e conversaram sobre as suas vidas desde o dia que se despediram embaixo do pé de Jasmim.

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